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Registramos, com pesar, a notícia do falecimento do amigo Naíde Cabral, uma das fontes de pesquisa do nosso livro: Santa Terezinha no assento da história. Satisfação de ter conseguido eternizar sua biografia, em anexo:

Naíde Cabral – de Sapateiro a Prefeito

Naíde Cabral da Nóbrega nasceu na comunidade rural conhecida por Serra da Onça, município de Patos, em 28 de março de 1935, como filho de José Lino e Áurea Cabral da Nóbrega, integrando uma prole composta por mais quatro irmãos: Francisco de Assis, Severino, Rita e Maria das Dores. A transferência da família para a área urbana ocorreu no mesmo ano do seu nascimento por influência do tio Mané Lino, irmão da sua mãe, que convenceu o seu pai a mudar-se para uma casa adquirida na Rua do Prado, argumentando que na cidade ele poderia criar melhores perspectivas de futuro aos descendentes. Os cunhados, então, iniciaram uma sociedade numa locadora de bicicletas, localizada no antigo sobrado da Rua Solon de Lucena, esquina com Miguel Sátyro. Além da exploração do pedal, o visionário conselheiro, que também possuía veículo de transporte de mercadoria, orientou o esposo da irmã a ingressar nesta atividade, momento em que ele adquiria um caminhão Chevrolet, fabricado em 1935, que estava à venda pela Usina Anderson Clayton (CLEITE), iniciando a nova atividade, auxiliado pelos filhos mais velhos e acompanhado pelo mais novo. Aos sábados, seguiam à grande comercialização que acontecia em Santa Terezinha, transportando os feirantes dos mais variados ramos. Na segunda-feira faziam o percurso inverso, conduzindo os comerciantes do então distrito, em sua maioria bodegueiros, para a sede do município de Patos, objetivando o reabastecimento dos estabelecimentos locais, além de outras pessoas, que vinham em busca de mantimentos. No período da safra eram responsáveis pelo transporte de grande parte do algodão.

No momento em que já vislumbrava o mesmo futuro: motorista de caminhão, depois de ter ajudado no transporte de tijolos para a construção do Mercado Público de Patos, além do descarregamento e transferência do sal trazido pelo trem para o comércio local, por conta da insistência da mãe, Naíde, aos 12 anos de idade, ingressou na profissão de sapateiro, tendo como primeiro patrão o seu cunhado Alírio. Paralelo a essa atividade, desenvolvida em um turno, se dedicava aos estudos, como aluno da professora Cristina, em época de grande dificuldade financeira, com seu pai sempre renegociando o débito com a escola, tendo como opção de lanche farinha com rapadura, mas aprendendo, com propriedade, além das demais disciplinas, as quatro operações matemáticas, requisitos indispensáveis para a manutenção de um ramo empresarial. Chegaria ao topo do ensino oferecido, dentro das possibilidades, no Curso de Admissão, depois de ter passado por outras docentes, a exemplo de Dona Ivonete.

Posteriormente, Naíde Cabral trabalhou com o empresário Laurindo. Em 1951, em decorrência de uma grande seca que descontrolou grande parte dos negócios comerciais, manteve-se na vaga, contudo a moeda de pagamento passou a ser gêneros alimentícios no armazém do pai de Codó. Com o passar do tempo, os valores restantes foram se acumulando, ao ponto de chegar a sete contos e quinhentos. A rede rasga e ele buscou a liberação do dinheiro correspondente à compra de um novo utensílio de dormida, no que foi negado e resolveu deixar a função. Mesmo sendo aconselhado a entrar na Justiça, aguardou o acerto, em dois meses, período em que prestou serviço ao empresário Inaldo. Pela atitude de não ter optado por uma demanda jurídica, recebeu, como gesto de gratidão, no momento em que se decidiu por abrir sua própria gangorra, todo o apoio do patrão anterior, lhe abrindo o crédito junto aos fornecedores de matéria prima e disponibilizando o seu modelador. Em Picuí, no ano de 1953, onde seu cunhado de nome Joel mantinha uma grande oficina de calçados, conseguiu adquirir sua primeira máquina. No retorno iniciou a fabricação própria, na residência do seu pai, contando com o apoio da família e os préstimos de um funcionário. A primeira dificuldade foi de mercado, acumulando toda a produção, até que, em determinado dia, conversando com Chico de Nené, proprietário de um caminhão misto que conduzia feirantes para Pombal, recebeu a sugestão de levar seu produto até lá, lhe disponibilizando o transporte e se comprometendo em conseguir ponto. Na impossibilidade de deslocamento encaminhou um emissário, que voltou sem nenhuma peça, com um apurado de seiscentos contos. Abria-se um horizonte comercial jamais imaginado pelo recém-empresário. De varejo passou a grosso, com clientes em Paulista, Sousa e Cajazeiras, onde começou a dominar a praça. O segundo espaço de trabalho, uma garagem, pertencia ao irmão Assis e em 1958 construiu a primeira sede própria na rua Padre Anchieta, quase uma mata, findando as reclamações dos moradores, com as batidas do martelo e o barulho das máquinas, dia e noite, chegando a ter 40 funcionários.

Em 1958, casou com Severina Medeiros da Nóbrega, filha do senhor João Pedra, dono da Dindinha, como era conhecida a Sopa, espécie de ônibus coletivo da época, que transportava garimpeiros e residentes da Mina do Ouro (Itajubatiba), no Vale do Piancó. Lembrou, Naíde, uma marcha divulgada nas épocas de crise de abastecimento de gasolina, em referência ao seu sogro que dizia: “O velho João Pedra / Que viaja lá pra Mina / Tá queimando Querozene / Por falta de Gasolina”. Do casamento nasceram os filhos: Regina, Célia, Rejane, Robério e o saudoso Robertinho, que faleceu aos 19 anos em consequência de uma Leucemia, além de uma filha adotiva, de nome Alexandra.

A aptidão de agropecuarista começou nas terras herdadas pela esposa e compra das áreas dos demais herdeiros, além de outras propriedades que adquiriu no município de Santa Teresinha, a exemplo de Maracujá e Urtiga. Foram as atividades do pai, proximidades com a família da esposa e afinidades conquistadas ao longo dos anos com vários segmentos de Santa Terezinha que levaram Naíde Cabral a um acompanhamento mais próximo da política, a partir do apoio ao candidato a deputado Zéu Palmeira e, de modo mais intenso, na última campanha de Severino Pereira à prefeitura, pelo qual torcia e o viu se deprimir com a derrota. No pós-eleitoral e recuperado do episódio, o derrotado vislumbrou na figura do consolador uma perspectiva de vitória para o seu partido. Depois de muita insistência, veio o fim da recusa e, na eleição seguinte, o que parecia improvável aconteceu: Naíde Cabral vencia o pleito, depois de abraçar o desafio e tomar por pirraça uma frase repetida por alguns adversários, colegas de faculdade de sua filha Regina: “Como é que um Sapateiro quer ser Prefeito?” E no palanque respondia: “Aqui não tem doutor não, o doutor são vocês”. Também somou ao seu favor, o convencimento do apoio de Zé Gayoso, a partir da disponibilização de um empréstimo para a sua campanha de deputado. Saíram derrotados: Zé Pedra, que somou para Naíde como sublegenda, e Silvino Corsino, o mais votado. Simeão Gentil, também disposto a concorrer, falecera antes do final da campanha. Outros importantes apoiadores: Chico Rufino (avô do seu candidato à vice, Bivar), Nicolau Vicente, José e Pedro Micena, peemedebistas históricos que já amargavam uma década sem vitória do partido.

Com relação às obras mais importantes, Naíde elencou os calçamentos da entrada da cidade, lateral da estrada, descida da igreja para a lavanderia, dentre outros pontos urbanos; acesso ligando as comunidades rurais de Santana a Quixaba (onde pavimentou a maior parte da serra), com chegada na Várzea do Arroz; construção de grupos escolares no Lajedo, Peregrinos, Loreto, Cachoeira e Maracujá; unidade de ensino, eletrificação e posto telefônico na Urtiga; Colégio Simeão Gentil, na área urbana; conjunto habitacional Chico Rufino, com 100 casas; 15 barreiros, com 1.500 horas/máquina, nas terras de José Avelino, Edvaldo Sarmento, Chico Sabino, Inácio e Zé Nunes, dentre outros. Destacou, também, a grande assistência dada no Transporte para: futebol, passeio, saúde em outros centros; Iluminação na cidade a vapor de mercúrio; compra de ônibus escolar e ambulância e lembrou que a Santana foi beneficiada com água e telefone. Ao final do mandato elegeria o sucessor, na pessoa do futuro genro Demetrius e, em seguida, uma das filhas: Regina Cabral. Ainda disputaria uma vaga de deputado estadual e chegaria a ser eleito vereador, cumprindo o mandato, deixando as disputas pessoais e voltando a se dedicar as atividades profissionais de agropecuarista e fornecedor de matéria prima, atividades nas quais se mantém. O ponto de comercialização de material para calçados sempre foi na Rua do Prado, primeiro em prédio alugado e posteriormente em uma estrutura que construiu. Com a morte da esposa, em 2010, passou a viver as lembranças e dedicar-se, de maneira mais intensa, aos filhos, netos e demais descendentes.

 

Damião Lucena – damiaolucena@gmail.com

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